Por muito tempo, não se falou abertamente — nem por governos, nem por imprensa — sobre o PCC. Pensava-se que dar nome era o mesmo que oferecer reconhecimento. Mas, às sombras, a facção criminosa que nasceu com seis detentos nos presídios de São Paulo se multiplicou. Hoje, são 33 mil filiados não mais a um grupo de presos, mas a uma organização internacional de drogas. Jogar luz sobre essa trajetória foi o que moveu o fotógrafo e documentarista João Wainer a gravar a série documental “PCC – Primeiro Cartel da Capital”, lançada esta semana pela produtora MOV, do UOL.
“É uma história que as pessoas precisam saber, porque a gente vive sob o domínio dessa facção aqui em São Paulo. Todo paulistano vive sob a lenda do PCC. Todo mundo sabe, todo mundo se lembra de 2006 [quando uma série de ataques parou a cidade]. Então, acho que é importante esclarecer para as pessoas o que é o PCC, como age, como pensa e o que está virando.”
A série documental é dirigida por Wainer em parceria com a MOV.doc, braço da produtora de vídeos do UOL especializado em documentários. E leva para as telas o trabalho de apuração dos repórteres do UOL Notícias Flávio Costa, Luís Adorno, Aiuri Rebello e Eduardo Militão.
“O trabalho de reportagem do UOL, que nos trouxe até essa realização, é um trabalho de longo prazo que estamos desenvolvendo diariamente, de jornalistas que respiram isso todo dia. É um esforço constante com fontes, para a gente levantar todo tipo de informação, que traz um pouco desse universo para o público”, afirma Murilo Garavello, diretor de conteúdo do UOL.
Para o filme, a equipe produziu uma abordagem diferente, que foge da busca constante pelo novo para dar uma visão mais completa do tema. “Será que a gente não tem em mãos uma grande história que está mal contada, está fragmentada, que as pessoas não estão conseguindo ver de uma maneira holística, mais geral? O grande aprendizado e objetivo do documentário foram não necessariamente trazer coisas novas, mas contar uma história que estava negligenciada por tantos anos”, afirma Aiuri Rebello, repórter que participou da produção.
Segundo o diretor João Wainer, a preocupação do projeto foi trazer um ponto de vista ainda não abordado sobre o assunto. “Acho que o PCC virar um cartel de drogas é uma informação que é conhecida, mas não é algo que o público geral sabe. Talvez a grande função do documentário seja essa. A gente não estava buscando um grande furo, a gente foi buscando contar uma história que está aí.”
Essa história, para Wainer, começou a conhecer entre 1998 e 2002, quando trabalhou dentro do Carandiru, num projeto chamado Talentos Aprisionados. “Foi quando ouvi falar do PCC pela primeira vez, e comecei a entender a nova organização que estava se formando na cadeia”, afirma.
Por isso, o diretor, que já assinou trabalhos como “Junho – o mês que abalou o Brasil” e “Pixo”, abraçou o projeto sem pestanejar. “Quando surgiu o convite de fazer o documentário, topei na hora, porque era uma oportunidade muito interessante de saber como uma organização que tinha um intuito político de combater os maus tratos do governo na cadeia virou um grande cartel internacional de tráfico de drogas.”
Para Wainer, a maior dificuldade da produção foi conseguir relatos, já que até hoje pouco se fala do assunto. “É uma história difícil de contar. As pessoas não falam muito, têm medo, a gente fica limitado em relação ao que pode conseguir. Então, a grande batalha é essa: fazer com que as pessoas falem de algo tão delicado. Mas é um desafio que me motiva.”
Para realizar a série documental, a MOV.doc produziu gravações em São Paulo, Santos (SP), Presidente Prudente (SP), Brasília, Rio de Janeiro, Rio Branco e Nápoles (Itália). E uma curiosidade: Geleião, o único fundador vivo do PCC, enviou uma carta escrita à mão para a reportagem do UOL. Em seu texto, que foi narrado no documentário, descreveu como fundou a organização e deu detalhes dos primeiros anos de atuação da facção no país.