Muitos anúncios antigos soariam chocantes hoje pela forma como representam mulheres. Objetificação, violência e misoginia faziam parte de um discurso naturalizado, refletido pela propaganda. A sociedade evoluiu. A publicidade, também. Mas há campanhas que, mesmo não reproduzindo violências, ainda tratam mulheres e homens de forma estereotipada. Mudar esse cenário é uma preocupação mundial. Em maio de 2018, a WFA (World Federation of Advertisers) lançou um guia para ajudar as marcas a tratar a questão do gênero de forma mais equilibrada. A iniciativa foi trazida ao Brasil pela ABA (Associação Brasileira dos Anunciantes), que é membro da WFA e da #Unstereotype Alliance (Aliança Sem Estereótipo).
Lançado na semana passada, durante o evento ABA Cannes Insights, o “Guia para Representação Responsável de Gênero na Publicidade” traz dados sobre como a mulher vem sendo representada na publicidade, além de passos importantes para evitar o estereótipo de gênero. “A publicidade pode ser um fator absolutamente relevante para reforçar valores positivos da sociedade. E é isso que esse guia traz”, afirma Vanessa Vilar, presidente do comitê jurídico da ABA e gerente jurídica da Unilever, que liderou a iniciativa no Brasil.
Alguns dados expostos no guia sobre representação de gênero no mundo servem de alerta para as marcas: 85% das mulheres não se veem representadas na publicidade (pesquisa Gender Bias in Advertising); 70% das decisões de compra de todas as marcas são feitas por mulheres (pesquisa Unlocking Opportunity for Women). “A gente está falando realmente de quem decide. Se ninguém ainda se convenceu de que é importante a causa social, de construir um mundo mais igualitário juntos, acho que a questão financeira está clamando por uma mudança nesse cenário”, diz Vanessa.
Veja cinco passos para “desestereotipar” os anúncios, segundo o “Guia para Representação Responsável de Gênero na Publicidade”:
1. Manter equipes diversas
Segundo o guia, o equilíbrio na representatividade de gênero precisa começar nas próprias equipes que trabalham com a criação e o branding das marcas, tanto internas quanto nas agências parceiras. Em times mais diversos, quando uma ideia estereotipada surge, ela é mais facilmente questionada e desafiada. “O resultado final deve ser uma mensagem mais poderosa, baseada em uma percepção profunda que ressoe mais efetivamente no público-alvo”, diz o texto.
2. Testar o desempenho
O guia sugere que monitorar a abordagem de gênero faça parte de um processo de teste prévio das campanhas. “Isso permite que as marcas eliminem ou melhorem elementos que possam prejudicar sua reputação antes de serem vistas pelo público”, diz o texto. A recomendação é para que as marcas busquem parceiros de pesquisa para identificar métricas claras.
3. Ter um propósito autêntico
Descobrir a verdade implícita que a marca representa pode fazer diferença real na forma como ela se relaciona com consumidores e funcionários. E é preciso ter autenticidade. Segundo o guia, este é um exercício de análise interna que pode ajudar as empresas a identificar questões estruturais que a impedem de incorporar e celebrar a diversidade.
4. Pensar no longo prazo
Apenas lançar uma campanha que trabalhe a questão de gênero de forma equilibrada não é suficiente, alerta o guia. “Ativistas e consumidores querem ver compromissos reais que vão além de uma única mensagem ou de um dia específico”, diz o texto. Pensar no longo prazo, criar um plano de ação, e investir para aperfeiçoar o modo como se olha para a questão de gênero é a estratégia recomendada.
5. Ir além da publicidade
Tomar medidas para equilibrar as relações de gênero requer mudanças em toda a empresa, ressalta o guia. “Isso significa estabelecer uma cultura que tenha consciência de gênero tanto para as pessoas internamente quanto para as mensagens externas”, afirma. Mesmo marcas com campanhas exemplares terão seus esforços prejudicados se ignorarem essas questões dentro de suas práticas. “Não adianta ter uma ótima publicidade se a sua empresa estiver sendo punida por não agir em conformidade com a igualdade salarial.” Além disso, outros aspectos da diversidade, como etnia, nacionalidade, religião, orientação sexual, também precisam ser contemplados pela cultura da marca.