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Meme com suco da Ocean Spray no TikTok é prova de que viral não se cria, se surfa

Imagem: Ocean Spray

Celebridade instantânea Nathan Apodaca, com sua caminhonete nova, doada pela Ocean Spray

O que faz uma mensagem viralizar? É possível construir um viral como ação de marketing? O que faz de um conteúdo um meme? A fama instantânea do vídeo de um homem tomando suco enquanto andava de skate é de causar inveja em qualquer estrategista de redes sociais. Mas será possível reproduzir a força de uma história real que surge nas condições de clima, pressão, temperatura e espontaneidade ideais?

O carro de Nathan Apodaca, 37, trabalhador de uma fábrica de processamento de batatas de Idaho, nos EUA, pai de duas filhas, quebrou. Sem ter como consertar, foi trabalhar de skate longboard. No caminho, fez um vídeo ao som de “Dreams”, música de 1977, da banda Fleetwood Mac. Enquanto fazia manobras leves pela estrada, cantava e tomava tranquilamente, na boca da garrafa, um suco de framboesa com cranberry, da marca Ocean Spray. Postou no TikTok seu momento “good vibe”, apesar do inconveniente. Virou estrela súbita na internet.

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♬ Dreams (2004 Remaster) – Fleetwood Mac

TikTokers de todo o mundo resolveram replicar a cena em skates, pranchas de wakeboard e até carrinhos de bebê por ruas e estradas. Um mês depois, o vídeo contabiliza mais de 66 milhões de visualizações e coleciona vários feitos: fez a música voltar ao topo da parada Billboard, bombou as vendas do suco de framboesa com cranberry, levando as ações da companhia a quase dobrar. Em gratidão, a empresa doou ao seu garoto-propaganda involuntário uma caminhonete nova, cor de framboesa, lotada de sucos, mantendo a conversa acesa por mais um bom tempo.

Sem contar as celebridades que entraram no desafio, como o próprio Mick Fleetwood, músico da banda, que abriu um perfil no Tik Tok especialmente para a interação. Ele foi seguido pelo CEO da Ocean Spray, Tom Hayes, e tantos outros como o apresentador Jimmy Fallon.

Como explicar que algo tão simples se tornou um fenômeno? O campo para hipóteses é vasto. Há quem extraia do vídeo uma mensagem de leveza em meio a meses tão duros de pandemia, como o diretor de assuntos corporativos da Ocean Spray, Chris Ferzli: “Apenas o fato de ele estar tirando o melhor proveito de uma situação, apesar de um desafio, realmente ressoou nas pessoas. Há uma energia tão calma e positiva no vídeo e, considerando que 2020 é um ano especialmente desafiador”, disse ao The Drum. Há quem avalie componentes sociais do personagem, que descende de índios americanos e vive num trailer, sem saneamento básico. Pode ser tudo isso, mas também pode não ser nada. Apenas acaso.

Se há uma lição a ser extraída do episódio, talvez, é a de que espontaneidade não se fabrica. Quando marcas tentam criar um fenômeno viral, controlando sua narrativa, orquestrando seu destino, já se perdeu a natureza da coisa, e consequentemente seu potencial de contágio. Talvez seja possível produzir artificialmente um conteúdo ou outro que tenha um certo fôlego, mas para algo organicamente viral não há modelos de criatividade.

O que resta às marcas, agências e seus criativos diante de um meme? Surfar, mostra a Ocean Spray. A empresa, aliás, atuou de forma acertada ao não se posicionar logo de início. Levou mais de uma semana para reagir ao fenômeno na internet, criando a ação que culminou na doação do carro.

Isso permitiu que o vídeo seguisse sua trajetória de viralização sem interferências por tempo suficiente para alcançar a crista da onda. À marca, bastou pegar seu skate e deslizar junto, dando novo fôlego às conversas quando se manifestou oficialmente. Na prática, a ação mostra que, na fase atual de compartilhamento de conteúdos em rede, em que um sucesso estrondoso pode nascer de qualquer canto, escutar as pessoas — o social listening — é tão essencial quanto falar a elas.


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