_Brainstorm

3 lições do movimento antirracista sobre posicionamento, após confusão de hashtags

Imagem: Reprodução

A morte de George Floyd, homem negro norte-americano assassinado por policiais brancos ao ser imobilizado, motivou uma série de protestos antirracistas pelo mundo. As manifestações tomaram a internet. E quem observou os movimentos #BlackLivesMatter (Vidas Negras Importam), criado por ativistas, e #BlackoutTuesday (Apagão de terça-feira), iniciado pela indústria fonográfica, viu timelines tomadas por quadrados pretos, uma chuva de hashtags e um questionamento dos ativistas: no que essas telas pretas ajudam?

Marcas, celebridades, influenciadores e público em geral buscavam dar força à mensagem antirracista, jogando as duas hashtags para cima. Mas, em dado momento, perceberam que, na realidade, estavam atrapalhando. O uso das duas hashtags nas mesmas postagens fez com que as denúncias de violência racista da campanha Black Lives Matter sumissem em meio ao mar de telas pretas do movimento Blackout Tuesday.

Como se posicionar em causas de grande comoção? Veja três lições do movimento antirracista, na voz de ativistas:

1. Propague vozes do movimento

Pare, escute, olhe. E promova a voz dos ativistas. O que as lideranças, influenciadores e pessoas atuantes no movimento estão dizendo? Como propagar essas mensagens? A filósofa e escritora Djamila Ribeiro está falando a 13,5 milhões de seguidores do ator Paulo Gustavo, que cedeu sua conta no Instagram à ativista, ao longo de todo o mês de junho. A iniciativa é tão simples quanto potente. Para ambos os lados.

O enfrentamento ao racismo precisa ser mais do que hashtags e posts com a cor preta para aliviar a consciência. É preciso refletir, ceder, ter compromisso de fato”, afirmou a ativista em sua coluna na Folha de S. Paulo.

 

Ver essa foto no Instagram

 

aqui é Djamila Ribeiro. Alguns de vocês normalmente me veem na página @djamilaribeiro1, mas nesse mês de junho também estarei aqui ocupando a página do queridíssimo Paulo Gustavo, o qual, numa ação histórica, cedeu sua página para que eu estivesse aqui conversando com vocês. . Às pessoas que não me conhecem, peço licença aqui me apresentar. Sou mestre em Filosofia Política pela Universidade Federal de São Paulo, autora de três livros: Lugar de Fala, Quem tem medo do Feminismo Negro? e Pequeno Manual Antirracista. Coordeno a Coleção Feminismos Plurais, que publica autoras e autores negros em livros didáticos e críticos. E também sou professora de jornalismo contra hegemônico na PUC-SP. Muito prazer! . Durante esse mês, vamos tratar de relações raciais, de lugar de fala, racismo estrutural e tantos outros temas fundamentais para a sociedade. Vamos discutir como nós podemos impactar na realidade de grupos sociais vulnerabilizados. Vivemos num país cujas desigualdades possuem origens históricas e entender esse processo nos ajuda a pensar o futuro. . Nesse primeiro vídeo, você pode conhecer um pouco de meu trabalho. Nossa aula começa no próximo encontro. Vocês podem deixar nos comentários temas que gostariam que fosse tratados. Teremos vários encontros aqui. Espero vocês!

Uma publicação compartilhada por paulogustavo31 (@paulogustavo31) em

2. Entenda a real função das hashtags

As verdadeiras mudanças podem não depender de hashtags, mas elas têm uma utilidade prática, que é organizar assuntos, levantar conversas e medir sua relevância nas redes sociais. Porém, o conflito inesperado entre as tags #BlackLivesMatter e #BlackoutTuesday mostra que seu mau uso pode gerar ruídos. No social listening, o mapeamento da conversa é estratégico para entender como se posicionar. Como surgiu o movimento? Qual o objetivo? De quem foi a iniciativa?

O advogado de saúde mental e a ativista do Black Lives Matter Kenidra Woods alertou sobre a confusão em seu perfil no Twitter:

Muitos aliados estão usando a hashtag #BlackLivesMatter com imagem preta no insta. Sabemos que não é intenção atrapalhar, mas sendo franco, isso prejudica a mensagem. Usamos hashtag para manter as pessoas atualizadas. Por favor, parem de usar a hashtag para imagens em preto.”

Para ajudar a desfazer o problema, a congressista norte-americana Alexandria Ocasio-Cortez, do Partido Democrata, fez a lição de casa e passou as orientações aos seus 4,6 milhões de seguidores no Instagram:

Se você postou uma imagem preta usando as hashtags BLM e Blacklivesmatter, etc. EXCLUA O POST e, se desejar, reenvie sem as hashtags. Mesmo que você edite a tag do seu post original, ela pode ainda permanecer, o que invisibiliza imagens de protesto e informações cruciais. Por segurança, apague e reenvie. Se você precisar postar uma tela preta, use as hashtags #blackouttuesday, #theshowmustbepaused etc., que foram originalmente criadas por organizações de mulheres negras na indústria da música.”

3. Representatividade ao contratar

O momento de comoção contribui para que a mensagem antirracista se espalhe, mas o posicionamento efetivo de pessoas e organizações se dá no dia a dia. Evandro Fióti, músico, empresário artístico e sócio da gravadora e grife de roupas LAB Fantasma, defende que marcas e corporações contratem pessoas pretas, se querem de fato contribuir na mudança da realidade. E isso deve valer em todos os níveis de cargos, incluindo lideranças, mesmo que exija das companhias redobrar esforços de busca e treinamento.

Vidas negras importam! Mas não podemos reproduzir isso pautados pela tragédia somente. Se não as valorizarmos, de fato, e não construirmos uma trilha onde a ascensão, sobretudo a econômica, seja possível para a trajetória de pessoas não-brancas, a morte de (e os protestos por) tantas pessoas terá sido em vão. Não podemos parar nas hashtags”, disse em seu perfil no Instagram.

 

Ver essa foto no Instagram

 

Não podemos deixar de apontar também que, ao longo dos últimos 11 anos, foram raríssimas as vezes em que visitamos escritórios de nossos colegas do mercado, como grandes gravadoras, editoras, produtoras, rádios, entre tantas outras, e encontramos pessoas pretas trabalhando em posições que fugiam do serviço da limpeza e dos serviços gerais. Vidas negras importam! Mas não podemos reproduzir isso pautados pela tragédia somente. Se não as valorizarmos, de fato, e não construirmos uma trilha onde a ascensão, sobretudo a econômica, seja possível para a trajetória de pessoas não-brancas, a morte de (e os protestos por) tantas pessoas terá sido em vão. Não podemos parar nas hashtags. Que possamos usar a energia explosiva desse momento para nos questionarmos enquanto sociedade e, de fato, darmos um cavalo de pau na história, conseguindo construir uma realidade onde a opressão racial se transforme, de vez, em passado. Ps: O vídeo foi gravado ontem, só que a internet não ajudou e UpLoad demorou. #Vidasnegrasimportam #Ubuntu #lab11anos

Uma publicação compartilhada por Evandro Fióti (@fiotioficial) em


Quem faz os conteúdos UOL para Marcas:

Apuração e redação: Renata Gama / Edição e redes sociais: Raphaella Francisco / Arte: Pedro Crastechini
Gerente responsável: Marina Assis / Gerente Geral: Karen Cunsolo